Por: Fernando Calmon
Sempre se costuma perguntar a razão de o Brasil não ter nenhuma marca de automóvel, utilitário ou comercial leve de origem genuinamente nacional. Afinal, como quarto maior mercado interno no mundo (e caminhando para terceiro, deve passar o Japão, mas pode voltar à quarta posição se a Índia deslanchar) as condições estariam dadas. Tentativas foram feitas, mas mesmo que vingassem seria bastante difícil sobreviver.
Indústria automobilística é bem mais complexa do que parece. Está muita sujeita a altos e baixos da economia e a regulamentações severas de segurança e emissões, além dos riscos industriais da produção seriada, entre eles o dos recalls. Por isso, várias marcas sucumbiram ou foram anexadas. Até hoje o cenário mundial não aparenta estar consolidado (ver abaixo em Roda Viva).
Nesse cenário a marca nacional que chegou mais longe foi justamente a que é sediada mais distante dos grandes centros consumidores, a Troller. Fundada em 1995, em Horizonte, a 40 km de Fortaleza (CE), pelo engenheiro cearense Rogério Farias, se especializou em utilitários parrudos para o fora-de-estrada. Produziram-se em torno de 10.000 unidades em 19 anos. Desde 2007 a marca se desnacionalizou – pertence à Ford –, porém sobrevive. O interesse se deu pelos incentivos fiscais criados para apoiar a descentralização da indústria em direção ao nordeste e centro-oeste.
Incentivos, aliás, há em todos os países. Só recentemente veio à tona o volume fabuloso de recursos que estados menos desenvolvidos nos EUA concederam às marcas japonesas, “convencidas” a se instalar no país depois de enfrentarem cotas de importação. O fato é que, por décadas seguidas, os estímulos retornam em valores muito superiores aos doados. No ano que vem se encerram as vantagens recebidas pela Ford (inclusive na baiana Camaçari), enquanto a Troller inicia agora outra fase com o novo T4 lançado semana passada.
Investiram-se R$ 215 milhões para aumentar a produção de 1.200 unidades/ano para 3.000/ano em apenas um turno com 400 empregos diretos. O processo produtivo em compósito de fibra de vidro para a carroceria é mais moderno e inclui seis robôs. O T4 foi totalmente reformulado, inclusive no estilo, que pode ser discutível, mas sem abrir mão de forma e função, hoje tão maltratadas em pseudoaventureiros que contaminam as ruas e estradas por puro modismo.
O novo Troller tem entre-eixos aumentado (agora 2,58 m), o que melhorou espaço para as pernas atrás, embora o acesso continue difícil como se espera de um veículo alto e de duas portas. O ângulo de saída passou para 51°, ou 14° a mais que o modelo anterior. Agora conta com motor Diesel 5-cilindros de 200 cv/48 kgf.m e câmbio manual de seis marchas, formando um conjunto mais silencioso e de alto desempenho com tração 4×4 temporária, reduzida e diferencial traseiro autobloqueante.
Preço é puxado – R$ 110.990; anterior R$ 97.000 –, porém seu público-alvo já tem dois outros veículos na garagem e concorrente direto, o americano Jeep Wrangler, não sai por menos de R$ 155.000 (gasolina). O preço inclui ar-condicionado digital bizona, computador de bordo, sistema de som (CD Player MP3), dois tetos solares fixos, rodas de aro 17 pol, proteções de partes inferiores e freios ABS específico para fora de estrada, entre outros recursos. Há mais de 130 itens de acessórios homologados.
Regulamentação do Contran dispensa instalação de airbags, mas uma futura versão de visual “civil” vai dispor das bolsas de ar, desativáveis por chave em caso de uso severo em baixas velocidades.
RODA VIVA
RUMORES sobre possível aquisição do grupo Fiat Chrysler pelo Grupo VW repercutiram no mundo, apesar dos esperados desmentidos. Conversas sempre há, no caso alimentadas pelo “desânimo” de famílias europeias com o negócio de automóveis, que já atingiu a Peugeot Citroën e alegadamente também a Fiat. No entanto, pode haver mais contras do que prós, segundo a maioria dos analistas.
CURIOSAMENTE, um dos obstáculos estaria no Brasil, pois enfrentaria óbices regulatórios de defesa da livre concorrência, situação inexistente nos tempos da Autolatina (Ford e VW fundiram suas filiais aqui em 1987). Há quem desconfie de que apenas a Alfa Romeo seria vendida à VW, pois a terceira tentativa de relançar a antiga marca de prestígio italiana não se mostraria viável e até atrapalharia o grupo ítalo-americano.
JAPÃO decidiu encerrar os incentivos específicos para seus microcarros urbanos – chamados lá de kei jidosha ou carros básicos, que usam motores de apenas 660 cm³, a maioria com turbo – por motivos fiscais e de distorções de mercado. Espera-se, em razão de preço, que se vendam menos veículos no país. Dessa forma, o Brasil chegaria à terceira posição no ranking mundial mais cedo.
PESQUISA feita nos EUA aponta que o advento da internet e as facilidades de pesquisas de modelos e preços levaram os compradores a visitar menos concessionárias antes de fechar o negócio. Antes, até seis lojas eram percorridas e agora, no máximo, duas.
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